segunda-feira, abril 25, 2022

Eos

Se existe alguém que pode personificar o alvorecer agora - és tu. 

domingo, abril 24, 2022

Metamorfose


Ideias formam-se na minha cabeça enquanto caminho pelas ruas, pelos jardins e pelas florestas. Penso sempre que me vou lembrar da intermitência que me chamou a atenção num momento mais oportuno para escrever sobre ela. Raramente acontece. Raramente me lembro. 

Sentada na relva ainda húmida, Ella fechou os olhos e deixou-se ser invadida pela inevitável paz que aquele sítio lhe transmitia. Pegou no caderno e começou a escrever sobre triângulos inacabados. Um cisne foi-se aproximando lentamente. Parou e ficou a olhar para Ella, deixando-se flutuar na água. Ella estava dentro de um videoclipe. O cenário cinematográfico e a música que estava a sair dos auriculares nos seus ouvidos tornou aquele momento idílico. O cisne começou a nadar e Ella sentiu que tinha de o seguir. Atravessou todo o jardim. Observou as árvores, o sol a querer penetrar por entre as folhas e os diferentes tons de verde que os seus olhos reconheciam. 

O cisne saiu da água e foi ter com Ella. Ficaram muito tempo a olhar um para o outro. Nem o cisne, nem Ella se mexiam. Às vezes não precisamos de palavras. Basta olhar para as cores e para as mensagens que quem se cruza connosco traz. O cisne trazia consigo leveza, luz, romance, melancolia, transformação e poesia no movimento. Tal animal majestoso trouxe consigo todas as verdades que Ella precisava de ouvir naquele momento. Chegou carregado de algo tão profundo que Ella não conseguiu compreender inteiramente. Quando lhe ia perguntar se o que estava a acontecer era real, o cisne bateu as asas e voou para longe sem olhar para trás. 

Ella formou um casulo no sítio onde foi abandonada pelo cisne. O paradeiro do cisne não se sabe e reza a lenda, que Ella nunca mais saiu do casulo. 

Lendas rezam-se, sim, mas ninguém sabe que uma mariposa branca pousou ontem no meu braço. 

segunda-feira, abril 11, 2022

Não se dorme, divaga-se

Sempre gostei de observar o aparecimento das letras e consequentemente das palavras enquanto escrevo. Parece magia. A possibilidade de transportar um pensamento para uma página e perpetuá-lo. É mágico. Gosto mais de escrever em papel, mas às vezes apetece-me ouvir o "clic clac" das teclas quando tudo está em silêncio.

Venho aqui a esta hora tardia, porque não consigo dormir. Devias evitar olhar para o ecrã do computador então, Joana. Sim, já sei isso tudo. Hoje é uma daquelas noites em que sei que não vale a pena insistir. Não me acontece muitas vezes, mas hoje sei que preciso disto. Preciso de fugir do dilúvio de reminiscências que as sinapses me estão a entregar e tentar partir para outras ideias. 

Isto foi desencadeado pelo filme que comecei a ver. Não, não foi só o filme. O filme ajudou porque me revi. Foi desencadeado pela decisão que tomei. Uma decisão que tinha de ser tomada mais cedo ou mais tarde. Eu acho que veio tarde. Que parva que sou. Que parva que fui. Ingenuidade? Talvez também um bocado. Acho que esperava mais de mim. Como é que depois de apenas um simples acontecimento perdi o equilíbrio da maneira que perdi? Não sei. Gostava de ter sentido as coisas de uma maneira menos infantil. Mas será que tinha sido tão genuíno como foi, se não tivesse agido apenas com o lado emocional? Por muito que me custe admitir, sei que tudo o que aconteceu não podia ter acontecido de outra forma. 

Os sentidos novos que ando a encontrar vão ser a alavanca para isto tudo mudar. Não vou cometer o mesmo erro de há uns anos atrás. Por muito pouco, não me deixei afogar. Estava-me a deixar ir agora, bem lá para o fundo, por isso é que precisei do ecrã. Do corte. 

Só mais um dia e vou voar. Voar daqui para fora, mudar de cenário. Outros cenários dão-me sempre a possibilidade de enraizar mais as ideias novas ou descobrir o que realmente preciso de fazer para avançar para onde quero. Há uns meses tive uma mudança de perspectiva em relação ao que gostava de construir daqui para a frente e é nessa direção que quero ir, porque pela primeira vez em muito tempo tenho uma certeza. Fui sempre fazendo as coisas no limite. Agora não quero que seja assim, mas para isso também tenho de parar de fazer merdas que me mantém acorrentada a abstrações que não passam de falsas crenças. Temos constantemente falsas crenças e damos significados às coisas que fazem com que seja muito mais difícil desprendermo-nos delas. Acreditamos e agarramos uma ideia por causa do significado que lhe atribuímos. A maior parte das vezes, o significado atribuído a algo, não passa de uma fabricação da nossa cabeça - que só está dentro da nossa cabeça, ou seja, não nos define! Estes produtos da nossa cabeça, podem então ser modificados quando nós quisermos, quando nós decidirmos e quando formos capazes. Há significados mais difíceis de transformar do que outros obviamente, mas acho que o poder está em saber que existe a possibilidade de o fazer, que não estamos entregues e ancorados a traumas do passado ou a determinadas ideias sobre nós próprios. Cada momento novo é um momento novo e nós podemos escolher quem queremos ser a partir de cada novo momento que criamos para nós. Temos de transformar os significados que demos a determinados acontecimentos, ou até a pessoas, para podermos realmente avançar com a cabeça resolvida ("não tenhamos pressa, mas não percamos tempo"). Se todo este processo fosse fácil, eu não estava a escrever sobre ele às 3h23 da manhã. 

Por agora chega. Vou tentar processar o resto das ideias a uma hora mais sã. Talvez o faça no avião. Sim, dentro do avião existe um tempo que não existe. Perfeito para divagações da madrugada.

sexta-feira, abril 08, 2022

Um passo para a frente e dois para trás.

Já estás habituada à dança.
Não gostas, mas já sabes que é assim. 
Conclusões deixam de ser incontestáveis. 

A vibração desce. 

Há algo estranho no ar. 
Todos os dias encontras alguém inesperadamente.
O que é que se passa?
E o encontro cinematográfico de sexta?
Se tivesse sido há uns anos ficavas a bater mal durante uns dias. 

A vibração sobe.

Que crescida que estás. 
Que bem que trabalhas as neuroses pontuais. 
E estão estas coisas a acontecer agora porquê? 

A vibração atinge um máximo.

Estás fodida. Foste tu que chamaste isto tudo. 
Estás fodida, mas sabes que tinha de ser assim.
Tens de levar tudo ao extremo,
tens de ter todas as sensações.
A torre cai. 
Tu cais.
Escombros. 

A vibração atinge um nível equilibrado. 

Vamos embora.
Um passo para a frente e dois para trás.

quarta-feira, abril 06, 2022

segunda-feira, abril 04, 2022

Crypto

 The end of life as she knew it.

domingo, abril 03, 2022

Acto 1

 "Tinhas alguma ordem lógica aqui?" - Ela olhou para ele com um ar confuso. Não será óbvio que tinha uma ordem na organização dos seus livros? Quem é ele para chegar à estante dela e começar a mexer nos livros todos à procura dos que tinham dedicatória? Quem é ele? Ninguém. As dedicatórias eram dela. Bastou um milissegundo para se aperceber das falsas convicções que alimentou nos últimos meses. O vidro partiu-se aos bocadinhos, a magia morreu. E agora? Agora inicia-se o teatro. 


"Hey i like your pictures what are you looking for" - ela disse-lhe que procurava sinais de pontuação. Ele respondeu que estava à procura de amigos e perguntou-lhe de onde é que ela era. Ela ficou incrédula a olhar para o telefone tentando processar tamanha lerdeza. Lerdeza. Que palavra. Não respondeu mais. A narrativa ficou pelo prólogo. 


"Buongiorno principessa" - ok. Querido. Meh. Formalmente sim, tudo o que fez foi atencioso. Ela sente-se desconfortável com coisas que ele diz. Infelizmente não consegue engrenar da mesma forma que ele. Receia que em breve ele lhe faça um convite. Ela vai dizer que sim. Ele tem um cérebro interessante e da última vez que se viram as horas voaram. Risos, poemas e cervejas. Ele gostou dela. Ela sentiu. Gostava de ser tua amiga. E agora? Agora inicia-se a escrita da peça. Vai correr mal. Que se foda. 


"A tua voz não é nada o que eu estava à espera" - ela também não estava à espera de sorrir quando ouviu a voz dele pela primeira vez. Assim é mais fácil. Mensagens de voz sem ter muito tempo para pensar e repensar no que se vai dizer. Tudo a correr bem? Sim. Combina o copo, vá. Tempo passa. Conversa esgota-se. Tic tac. Já não vai dar. Não, não iniciou o teatro desta vez. Ele tinha qualquer coisa. Ela ergue a muralha. Peça fica por escrever.


Acto 2

sexta-feira, abril 01, 2022

Ómicron

No outro dia comecei a contar uma história. 
Uma história que ficou inacabada, sem final triste, feliz ou neutro. 

Já devia haver um vírus a percorrer as minhas células.
As ideias ficaram turvas,
as palavras deixaram de se formar
e restou uma opção: hibernar. 

Quem diria que uma hibernação primaveril seria sinónimo de serendipidade?

Talvez tenham sido as alucinações causadas pelo estado febril,
talvez as epifanias transportadas por filmes aleatórios,
talvez as músicas que foram revisitadas numa condição cerebral débil. 

Não sei. Sei muito pouca coisa. 

Vieste em boa hora, Ómicron. 
Juntar um pouco mais de simbolismo ao processo. 
Mais uns dias e a metamorfose completa-se. 
Cada vez mais acho piada a esta capacidade.
E a Kausalketten, também acho cada vez mais piada a Kausalketten.

(Ödipus - Ómicron - gesto idiota)